Acredito que poucos sabem, mas eu surfo desde os 12 anos de idade, ou desde os 7, se pegar onda com pranchinha de isopor contar.
Essa paixão surgiu na época em que meus pais acampavam praticamente todo final de semana no litoral paulista. Eu costumo brincar que, na época, levei picada de borrachudos, pernilongos e do bichinho do surf.
Sempre que tenho a oportunidade, viajo para lugares onde posso surfar. Recentemente retornei de Bali, na Indonésia, lugar que eu e a minha esposa simplesmente adoramos pela beleza natural, clima, simplicidade, energia, ondas e a forma como sempre somos acolhidos por lá.
Hoje, contarei a história do Kadek, o rapaz que entregava toalhas aos hóspedes do hotel.
Conheci o Kadek na minha primeira viagem a Bali em 2012. Ele era responsável por oferecer toalhas aos hóspedes na área da piscina. Kadek estava sempre com sorriso no rosto, sabia de cor algumas frases em português para agradar aos brasileiros que estão por lá e, quando o movimento está baixo, ele saía do seu posto de trabalho para puxar assunto com hóspedes que gostam de conversar e eu era um desses.
Logo na minha primeira viagem fomos nos tornando próximos, nos seguimos nas redes sociais e, mesmo à distância e sem saber se um dia eu voltaria àquele lugar paradisíaco, Kadek fazia questão de manter contato comigo. Ele sabia o nome dos meus filhos, fazia um esforço enorme para me escrever em português ou, simplesmente, saber se estava tudo bem.
Fui uma segunda vez à Bali e, a cada dia que passava, nos sentíamos cada vez mais acolhidos naquela ilhota tão distante da gente. Kadek era um dos responsáveis por isso, pois não precisávamos mais pedir nada. Ao chegarmos à piscina ele já aparecia com as toalhas e nos oferecia nossas bebidas.
Até que eu disse: “Kadek, você deveria ser o gerente deste hotel. Você sabe mais do que ninguém como encantar o seu cliente. Você realmente se importa com as pessoas. Não é nada forçado! Isso é seu! É um dom”.
Coincidência ou não, após essa segunda viagem, o Kadek me mandou uma mensagem informando que havia se endividado para comprar um carro e que, a partir daquele momento, ele também poderia nos pegar no aeroporto caso voltássemos à Bali. Eu digo se endividar porque aqui no Brasil uma pessoa com este emprego/cargo já tem grande dificuldade para comprar um carro, mas talvez você não tenha ideia da dificuldade para alguém nas mesmas condições de trabalho em Bali. O salário lá é muito, mas muito baixo
Terceira temporada em Bali. Kadek dava um jeito de usar seu banco de horas para sair do hotel e ser o nosso transfer. Sempre muito solícito, fazia questão de buscar os seus hóspedes. Detalhe: esse serviço não tinha nada a ver com o hotel. Era ele, com o carro dele, nas horas vagas e, não raras vezes, trabalhando até durante a madrugada.
Na ilha existem algumas maneiras de se locomover. Para caminhos curtos você pode alugar uma Scooter, para caminhos longos você paga transfers relativamente caros; ou você tem um amigo como o Kadek que simplesmente te empresta o carro. Sim, mesmo me conhecendo somente em nossas viagens, ele fazia questão que eu usasse o carro dele. Parece loucura, né?
Assim é o Kadek, um cara extremamente simpático que, mais do que servir, confiava de forma absurda na gente!
Até que um dia, já de volta ao Brasil, ele me procurou novamente para informar que havia sido desligado do hotel. Aquilo poderia ser um final trágico, mas era o empurrão que ele precisava para ser dono do seu próprio negócio!
Kadek se transformou no melhor Transfer & Guide que eu conheço no mundo. Sem exageros, ele é muito bom. Além do seu trabalho, ele dedica parte do seu tempo livre para ensinar aos jovens locais, muitas vezes sem qualquer orientação, o caminho para progredir na vida de maneira honesta, por meio do serviço de atendimento ao turista, exatamente como ele vem fazendo. Tudo isso sem cobrar nada.
Aqui vai um resumo da minha quarta e última ida a Bali:
1) Kadek me busca no aeroporto. Durante o caminho para o hotel, ele saca um modem 4G e fala: “use enquanto você estiver em Bali. Assim, você não precisa se preocupar em habilitar seu chip ou pagar caro por um chip local”.
2) Na manhã seguinte, ele me manda uma mensagem e fala que a moto dele está no estacionamento do meu hotel, com o tanque cheio, e que a chave já está na recepção. Detalhe: eu nem havia pedido, mas ele sabe que eu sempre alugo uma motoca para dar os meus rolezinhos por lá! 😉
3) Comentei com ele que o hotel estava bem diferente (pior), e ele nos arranjou outro hotel absurdamente melhor e, claro, fez o nosso transfer.
4) Certo dia, pedi para que ele me levasse a um local distante ou, então, que me emprestasse o carro para eu ir sozinho. Ele já tinha outro transfer agendado, mas deu um jeito de me arranjar um carro e o deixou no hotel à minha disposição.
5) Resolvemos conhecer Nusa Lembongan, uma ilhota próxima à Bali. Ele se prontificou em arranjar o barco para nos levar e buscar na data combinada. Também guardou TODAS as nossas malas em sua casa, afinal, fomos para essa outra ilha apenas com uma mochila e uma prancha.
6) Como essa ilha era mais rústica, eu não sabia se conseguiria pagar tudo com cartão e estava com pouco dinheiro local. Ao pedir para ele parar numa casa de câmbio, ele sacou um pacote de dinheiro do bolso e disse: “toma, depois a gente se acerta!”. Juro que não acreditei no que vi!
7) Mesmo depois de já estarmos sob os serviços da empresa que faria o transporte no barco para Nusa Lembongan, ele nos acompanhou, literalmente, até a areia. Enquanto aguardávamos o embarque, ele não saiu do nosso lado até que estivéssemos efetivamente dentro do barco. Além de tudo, apareceu com garrafinhas de água gelada, providencial, naquele momento de sol escaldante.
8) Ao encontrar Kadek em nosso retorno, ele se desculpou por não estar com nossas malas, pois havia acabado de realizar um transfer e não tivera tempo de ir buscá-las, mas disse que não precisávamos nos preocupar, pois o primo dele já as estava entregando em nosso hotel.
9) Último dia: tomamos umas Bintangs, demos muita risada, e chegou a hora de acertar as contas. Kadek não quis me falar o preço, pediu apenas para que eu pagasse o que eu achava justo e avisou que, se o justo fosse muito alto, ele devolveria o valor excedente.
Eu tentei calcular o que achava justo e, claro, quando viu o valor oferecido ele me disse: “Fábio, é muito. Pode tirar 50%”. Eu insisti muito para que ele ficasse com o dinheiro, mas ele resistia dizendo que era muito e que não iria se sentir bem aceitando. Pedi, então, para que aceitasse a quantia justa pelos seus serviços e que guardasse a diferença para os seus filhos, Maylo (11 anos) e a Fia (6 anos). Kadek se emocionou muito, e claro, nos emocionou também.
Sei que no Brasil as coisas são diferentes e nem tudo o que aconteceu nessa história (real) é aplicável, mas se tem uma pessoa que sabe encantar seu cliente, se tornar amigo e gerar uma dívida de gratidão, esse cara é o Kadek Sucipta, o melhor Guide & Transfer que eu já conheci.
Terima kasih banyak, Kadek!
Que consigamos encantar os nossos clientes tanto quanto você 😉
Escrito por Fabio Hayashi.